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Aforas da Cidade do Porto - Paço dos Arcanjos

Yochanan


Quase um mês havia se passado desde a última vez que ali havia estado, e as mudanças eram visíveis. Duas novas construções de madeira se haviam erigido no terreno, uma delas, um edifício retangular era a enfermaria, a outra uma pequena plataforma que servia de atalaia junto aos portões. Os caminhos ainda que enlameados estavam tão limpos quanto era possível, e a neve acumulada formava baixas paredes aos lados deste.

O grupo era grande, e avançava sem pressa aos portões da propriedade. O vigia ao ver-los, deu logo o aviso, e os portões se abriram em par. O espirito do grupo era leve, contente de retornar àquela que já era sua Casa. À frente cavalgava o Viana, Prior daquela comunidade, secundado por Eleazar, os demais homens vinham logo atrás, incluindo a Carmelo, e os homens que o acompanharam.

Dimas aguardava junto a um grupo de rapazes pouco além dos portões. Neste dia, estavam todos ali. Os trinta e três membros da Ordem.

Dimas então disse: - Seja bem vindo à casa meu senhor Prior Yochanan Viana.

E ao passo que os demais baixavam a cabeça em sinal de respeito, uma figura no meio do grupo de Dimas olhava fixo ao Prior. Com as feições da mãe, era Celestis, sua filha, a quem Yochanan dirigiu seu olhar, e disse.

- Bons olhos voltam a verte filha minha.
Celestis_pallas


Celly dormitava como um anjo quando aqueles soldados se aproximaram. A temer que estivesse ferida ou algo assim, rapidamente a examinaram, com o cuidado de não violar sua integridade, afinal, era uma mulher e merecia todo o respeito daqueles homens treinados.

Tão logo a tomaram nos braços, Celestis tensionou despertar, mas uma voz muito educada sussurrou em seu ouvido para que descansasse o máximo que pudesse. Celly parecia agitada, era natural, afinal, não sabia quem eram e nem para onde a levavam! De sua boca, já era possível notar um vapor espesso, fruto do contato do calor de seu corpo com o ambiente, que esfriava rapidamente.

Envolvida em uma grossa manta de lã, quase a pesar tanto quanto a jovem, fora levada ao Paço dos Arcanjos a rápido galope. O rapaz tinha um semblante sério e usava vestes negras, tais quais Sancha descrevera. Poderia perfeitamente ser um malfeitor e Celestis teve medo, mas não reagiu. Era um moço belo e a segurava com a delicadeza de uma flor.

Amarraram os cavalos e levaram a menina direto à enfermaria, onde seria melhor examinada. Ouvira a voz de Sancha, que quase gritava, a implorar para ver a amiga. Ao ouvi-la, Celestis sentiu-se mais segura, certamente estava em uma casa amiga.

Mesmo a não sentir nenhuma dor ou fraqueza, estava cansada e temia estar doente, já que recebia tantos cuidados. Preferiu então permanecer quieta em seu leito, com os olhos cerrados. Mas, os ouvidos estavam despertos. Bem despertos. Quando Dimas aproximou-se, pôde reconhecer seu timbre de voz e logo associou o amigo de seu primo John Rafael aos homens de capa negra. Certamente, era um deles.

Dimas logo adormeceu em uma cadeira e Celestis aproveitou-se para caminhar pela casa. Sancha e seu Machado tomavam um pouco de chá na sala. Era um chá diferente, pelo menos, não cheirava a um chá de ervas comuns que toda a gente costumava beber.

- Sancha!!! Que bom que me esperastes!

A amiga correu em seu abraço, a chorar copiosamente. Também imaginava que Celestis estivesse doente. Celly lhe contou sobre a floresta e dedicou-se longos minutos para falar sobre a tal lápide. Certamente, a história emocionou a todos, inclusive ao pai de Sancha. Finalmente, Celestis pôde sanar todas as suas dúvidas:

- Onde estamos, afinal? Por que fui trazida para dentro e sequer me deixaram sair da cama?

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Sancha


Sancha admirava a amiga, que parecia ser um poço de serenidade quando o queria! Se aqueles homens misteriosos a carregassem pela floresta daquela maneira, com certeza a loira já teria feito o maior escarcéu!

- Tu estás no Paço dos Arcanjos, pelo menos, é o que ouvi falar! São uns soldados, devem ser pessoas boas, apesar das caras sérias! Estão a tratar-nos muito bem e disseram que queriam te ver descansada antes de voltarmos. Quanto te encontraram, estavas salpicada de neve e com os lábios muito azuis, temiam que tu tivesses te congelado igual a uma pedra!

Celly levou as mãos à boca, um pouco assustada e empalidecida. Estava a se sentir tão bem e tão consciente que jamais imaginara seu estado! Felizmente, ao que parece, fora apenas uma reação comum ao frio e o fato é que já se encontrava forte e saudável como sempre. Só algumas tosses e espirros a incomodavam. Foi quando Dimas, meio atabalhoado, apareceu à porta e logo pediu que Celly se sentasse e tomasse imediatamente um chá de ervas medicinais. Parecia um pouco assustado em ver a menina fora da cama e a tratava como se fosse de porcelana. Celestis não entendia tamanhos cuidados.

Depois de todos estarem fartos de chá, bem como, de alguns nacos de pão com pasta de amendoim, Dimas recomendou que fossem dormir lá mesmo, pois já estava muito tarde. Celly se preocupava com John, que ignorava completamente tudo o que acontecera. Dimas então providenciou que um dos soldados partisse rapidamente ao Solar das Telhas Azuis e avisasse o primo da menina sobre todo o ocorrido.

E os dias subsequentes já anunciavam ser especiais! Celestis encontraria seu pai!


Celestis_pallas
Yochanan wrote:


Quase um mês havia se passado desde a última vez que ali havia estado, e as mudanças eram visíveis. Duas novas construções de madeira se haviam erigido no terreno, uma delas, um edifício retangular era a enfermaria, a outra uma pequena plataforma que servia de atalaia junto aos portões. Os caminhos ainda que enlameados estavam tão limpos quanto era possível, e a neve acumulada formava baixas paredes aos lados deste.

O grupo era grande, e avançava sem pressa aos portões da propriedade. O vigia ao ver-los, deu logo o aviso, e os portões se abriram em par. O espirito do grupo era leve, contente de retornar àquela que já era sua Casa. À frente cavalgava o Viana, Prior daquela comunidade, secundado por Eleazar, os demais homens vinham logo atrás, incluindo a Carmelo, e os homens que o acompanharam.

Dimas aguardava junto a um grupo de rapazes pouco além dos portões. Neste dia, estavam todos ali. Os trinta e três membros da Ordem.

Dimas então disse: - Seja bem vindo à casa meu senhor Prior Yochanan Viana.

E ao passo que os demais baixavam a cabeça em sinal de respeito, uma figura no meio do grupo de Dimas olhava fixo ao Prior. Com as feições da mãe, era Celestis, sua filha, a quem Yochanan dirigiu seu olhar, e disse.

- Bons olhos voltam a verte filha minha.




Celestis já estava previamente a saber de que receberia uma surpresa, mas não imaginava que tipo de surpresa. Só recomendaram que preparasse bem o coração e os ânimos! Há cerca de uma quinzena estivera naquele mesmo local, meio que por acaso do destino, mas agora, fora tudo previamente combinado e estabelecido. Por cerca de quinze dias ou menos suspirara com a boa nova, mas não fazia a menor ideia. O que uma jovem de catorze anos poderia esperar? Um cavalo novo? Um bom emprego? Um título? Não, nada fizera para merecê-lo, era ainda muito imatura.

Quando o homem desceu do cavalo e foi se aproximando, Celly notou que lhe era muito familiar. Poderia bem ser o seu pai, mas como, se era falecido? Os cabelos, antes aloirados, agora eram pouco mais escuros. Isso se realmente fosse quem pensava que fosse! Mas, não, estava a ver coisas!

- Tu me chamastes de filha? E o meu verdadeiro pai? Quem era ele?

Yochanan riu-se! Como haveria de lembrar-se dele, era tão jovem! Outrora lhe gostava tomar um pouco de sol e por isso os cabelos pareciam dourados, mas agora, estavam levemente mais escuros. Também deixara a barba crescer, é verdade. E alguns fios brancos começavam a despontar.

Mesmo naquele tamanhão de moça bonita, Yochanan a suspendeu pelos braços, como fazia quando ela era criança. E Celestis Pallas imediatamente associou aquele gesto simples e carinhoso à figura tão paternal daquele homem! Era o seu pai, sim, aquele mesmo que desaparecera e fora dado como morto! Celestis o abraçava e beijava copiosamente, sem acreditar que aquilo tudo fosse possível! Depois, conteu-se...tinha medo de que aquela paz fosse passageira...acostumara-se à orfandade, à insegurança, ao negativismo.

A suspender seu queixo, seu pai prometeu-lhe que jamais a abandonaria novamente, a não ser que a morte, tão cruel e inesperada, ceifasse sua vida. Celly jamais duvidara de nenhuma palavra dita por seu pai e consentiu, a abrir um enorme sorriso naqueles lábios róseos!

- Amo-te, papai! Amo-te muito! Sempre amei-te!

E deixou que as lágrimas finalmente caíssem...

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Yochanan


Yochanan pode apenas rir sorrindo, já no casamento de seu sobrinho havia se percebido que a pequena não o havia reconhecido.

Apeou do cavalo em que montava, e se aproximou da pequena ainda rindo sorrindo, havia mudado tanto desde a última vez que ela o havia visto, e a pequena havia crescido, e o Prior chegou a pensar para si mesmo que se não fosse o incrível parecido dela com a mãe, talvez não a tivesse reconhecido se a cruzasse pela cidade.

O tempo não espera por ninguém, ecoou em sua memoria a voz de seu primeiro mestre, o já falecido Padre Bernardo. E realmente, o tempo não espera por ninguém. Já havia perdido toda a infância de sua filha, mas havia sido um sacrifício que a pequena algum dia entenderia.

Com ela de novo em seus braços, a segurou firmemente por alguns instantes, como se tentando deter o próprio tempo naquele re-encontro.

Levantou-lhe a face e olhou em seus olhos que se enchiam mas teimavam em chorar e percebeu o quanto havia sofrido em silêncio.

- Minha filha, peço-te que me perdoe, não espero que entendas o porque tive que deixar-te a tantos anos, mas espero que compreendas que não houve outro modo, e fiz o que tinha que fazer. Mas agora tudo terminou, e não mais te deixarei até que a sombra inevitável venha por mim.

E abraçou novamente a filha.

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Um novo dia raiava no Paço dos Arcanjos, e a luz nascente revelava aos poucos o pouco que restava de pé da antiga vila romana e as construções de madeira que serviam de abrigo à comunidade.

Homens de negras capas circulavam pela propriedade imersos em seus afazeres. Aquela manhã o Prior acompanhou a Dimas por um percorrido pela propriedade.

Começaram pela antiga vila, grandes porções do telhado se haviam perdido há muitos anos, e varias paredes haviam cedido. Algumas colunas permaneciam de pé, enquanto outras jaziam deitadas cobertas de neve.

Parte do segundo andar teimava em resistir na ala noroeste da vila. Os grandes arcos que uma se erguiam a ambos lados da casa em pares resistiam quase intactos. Ao sul da casa, o pequeno templo não estava em melhores condições. Atrás do templo, uma longa piscina não via água limpa a muitos anos, cheia de neve e lodo quase não se via no terreno. Um caminho partia da que tinha sido a entrada daquela casa, até a piscina, bifurcando um caminho que e dirigia ao templo. Este mesmo caminho seguia ao sudeste até os portões que separavam a propriedade do caminho que levava a estrada. Junto aos portões as estatuas que davam o nome à propriedade se erguiam orgulhosas. A um lado destas se encontrava a recém erguida plataforma que servia de atalaia.

A esquerda do caminho, em direção à casa se encontravam os barracões de madeira que serviam de comedor comum e dormitório para os 33 homens que compunham a comunidade, deste mesmo lado mais atrás, outra estrutura se erguia, ali funcionava a enfermaria. À direita do caminho se erguiam os depósitos e junto a este uma pequena cozinha. Atrás destes estavam os estábulos provisórios.

O resto da propriedade se compunha de campos, que agora se cobriam de neve e o muro que cercava o terreno. Ao outro lado deste a colina na qual se encontrava a propriedade continuava a descer até a estrada e o bosque que cobria o vale.
Celestis_pallas


- Já raiou o dia! Anda, Sancha, vamos ver o que aqueles rapazes estão a aprontar!

As meninas Celestis e Sancha decidiram passar mais um dia e uma noite ali. Yochanan mal chegara e já estava a dar ordens aqui e ali, bem como, ajudar no que podia para que aquele local estivesse habitável o mais breve possível. Acordaram com o barulho das marretas a bater e das escadas a recostar nas paredes. Não era a melhor maneira de se acordar, mas era o som que denunciava o fato de seu pai estar vivo e para Celly isso era o que mais importava!

Após levantarem-se e trajarem-se, espiaram pela janela da enfermaria. Era um lugar também não muito agradável, sendo pouco menor que o barracão dos dormitórios. Além disso, cheirava a ervas medicinais e tudo era irritantemente limpinho. Celestis fazia piada, dizia que só com o aroma de todas aquelas ervas juntas era possível obter vida eterna e que com certeza seu pai estava vivo até hoje porque finalmente encontrara uma "fonte de juventude"!

Saíram devagar, a espreitar...não queriam causar alarde próximo àqueles homens. Eram muitos e as moças ficavam constrangidas, bem como, eles mesmos acabavam se sentindo um pouco assim. Punham-se a andar e rir-se baixinho, com as mãozinhas à boca, feito passarinhas saltitantes e piadeiras... Celestis estava feliz que Seu Machado dera uma trégua à filha, que cortara tantos pinheiros por aqueles dias. Agora estava ali, a gozar uma folga com a amiga.

- Bons dias, papai! Que bons ventos, ou melhor, que boa nevasca o trouxe, não é? Espero que o mantenha aqui!

Sancha repete a mesma vênia e o mesmo "bons dias" de Celly, ainda que um pouco desajeitadamente. Logo à frente vem Dimas, preocupado em saber se as meninas haviam tomado o desjejum. Celestis sabia que o pai estava muito ocupado, mas queria ao menos comer o primeiro naco de pão da manhã pela primeira vez em tantos anos junto a ele.

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Yochanan


A longa viagem havia deixado o grupo cansado, e como tal havia se retirado mais cedo na noite anterior. Com tantos afazeres no Paço, a Yochanan não lhe havia sobrado muito tempo para dedicar à filha, mais que aqueles momentos que compartiram quando da sua chegada.

Com o raiar do novo dia, o Prior deixou que sua menina descansasse das emoções do dia anterior, e partiu logo cedo a um percorrido por aquela antiga propriedade que agora os abrigava.

Após o recorrido, enquanto retornavam aos barracões, encontraram as duas jovens, e únicas moças do grupo que agora vivia no paço.

- Bons dias, papai! Que bons ventos, ou melhor, que boa nevasca o trouxe, não é? Espero que o mantenha aqui! - disse Celly

Sancha repete a mesma vênia e o mesmo "bons dias" de Celly, ainda que um pouco desajeitadamente.

Yochanan sorri a ambas, mas é interrompido por Dimas quem preocupado vai logo perguntando com a preocupação que os avós geralmente mostram aos seus netos.

- Bom dia meninas. Já tomaram o desjejum?

Ao que ambas fizeram que não com as cabeças, e Yochanan disse então.

- O que acham de acompanhar a estes dois velhos no desjejum. - disse rindo indicando a si e a Dimas, pois aos muito jovens, qualquer adulto parecia um ancião. Assim, os quatro se dirigiram ao refeitório. A comida era simples, nada de grandes banquetes, ou desjejuns cheios de iguarias. Comiam nacos de pães recém feitos, pois era domingo, e cerveja aguada.

Sentados à mesa, o silencio reinava no refeitório, ainda que houvessem quase quinze homens a comer juntos naquele momento. Assim em voz baixa, Yochanan perguntou:

- Que querem fazer hoje, meninas?
Celestis_pallas


- Que querem fazer hoje meninas? - indagou-lhes Yochanan.

Marotamente, ambas se entreolharam e puseram-se a rir. Geralmente Celestis era um pouco mais séria e contida, Sancha era seu contraponto. Agora, Celestis comportava-se também como uma jovem pândega, de olhar vivaz e pouco inclinada a corrigir e medir cada passo. Todo o Paço dos Arcanjos parecia respirar Carpe Diem. A casa, retirada mais ao campo, uma espécie de Fugere Urbem, propiciava tais pensamentos. Além disso, seu querido pai a fazia sentir-se mais desarmada ante o mundo que a circundava.

- Bem...nós pensamos que talvez...Pudessem erigir uma pequena casinha para mim! Olha, eu fiz o desenho! A Sancha ajudou um pouco, ela fez o telhado...

Yochanan compreendia que realmente sua filha não poderia mais morar ali naquele barracão, mesmo porque, seria indecoroso e até desconfortável dormir na enfermaria quando houvesse algum ferido ou enfermo em tratamento. Uma pequena casa de poucos cômodos, isolada do restante e com um caminho que iria direto ao portão da propriedade, era isso que Celly desejava. Além disso, era um começo, quando estivesse mais adulta poderia morar sozinha e assim já metia-se a treinar.

Era um papel dobrado em quatro. Com um pouco de pincel e tinta que Celestis tinha pedido emprestado a John, artista da heráldica, as moças fizeram um desenho muito mimoso do que imaginavam. Pintaram tudo de cor-de-rosa e até acrescentaram as flores à janela. Certamente, preocuparam-se mais mesmo com a aparência do que os detalhes técnicos, aquilo sequer era uma planta. Mas funcionava como inspiração a um bom projetista.

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Yochanan


Bem...nós pensamos que talvez...Pudessem erigir uma pequena casinha para mim! Olha, eu fiz o desenho! A Sancha ajudou um pouco, ela fez o telhado... Foi a resposta que recebeu de Celly junto com o desenho infantil que lhe entregava. E sorriu, sorriu porque havia esperança naquelas palavras, sorriu porque havia inocência naqueles traços, sorriu porque havia visto as trevas e agora a luz brilhava mais forte, sorriu, apenas sorriu.

- Querida, veremos o que podemos fazer, mas construir uma casa leva muito tempo, e o inverno ainda está sobre nós. Viste as grandes ruínas, ali mais acima no morro, aquela será nossa casa, e assim que o tempo o permitir a reconstruiremos firme, forte e bela. - disse o Prior indicando às ruínas com um ademão. - Além disso, sois ainda muito jovem para viver só, e não o permitirei, ainda. - A voz do Viana se mantinha num tom calmo e numa cadência tranquila, e mudando o assunto, continuou. - Dimas me disse que você já esteve explorando a floresta quando te trouxeram para cá. Quer dar um passeio?
Celestis_pallas


Na floresta? Não, obrigada... - disse Celly, mudando subitamente o tom de voz e fechando seu até então permanente sorriso. Recolheu o papel, como se abandonasse os sonhos para encarar a realidade e guardou-o no bolsinho da saia. Celestis ainda estava um pouco sentida em ter visto o túmulo da mãe, apesar de ter se reconfortado em conhecer seu destino final.

- Podemos dar uma volta pela vila mesmo...que achas, papai??? ...depois, vamos à olaria, quero escolher uns vasos...podes deixar comigo a decoração da casa, sei bem o que fica bom!

A menina era ansiosa! Mal a casa estava em pé e já pensava nos adornos! De repente, Sancha lembrou-se que seu pai pedira a ela não voltar muito tarde...

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Yochanan


- Uma volta pela vila, é uma excelente ideia pequena. Mas o que achas de irmos até a cidade mesmo? se saímos agora chegaremos ainda com luz no Porto, e amanha podemos passar o dia no mercado, assim tens tempo de escolher o que queres sem pressa nenhuma. - disse Yochanan adicionando em seguida. - podemos também visitar ao teu primo John. Gostas da ideia?
Celestis_pallas


- Oh, mas seria perfeito! - exclamava Celly, com a empolgação duma criança e a impetuosidade própria da idade.

Yochanan esperava...Ora, as mulheres, sempre tão cuidadosas com o toucador! Seu pai ainda teria de esperá-la muito. Isso quando não estava prestes a sair e então retornava, crente de ter se esquecido de um detalhezinho bobo.

Enfim, Celestis Pallas estava muito bem trajada para o passeio. Só não estava devidamente agasalhada, como bem lhe aconselhou Dimas. Temia que pegasse um resfriado e tudo por causa daquela noite nevada na floresta, sozinha!



- Ai, que esqueci-me do casaco! Onde penso que vou com esses braços à mostra?

Retornou, a tomar um casaco, também azulzinho, com pelos nas extremidades. Até levou um leque, caso sentisse um súbito calor defronte a lareira do primo. A situação era de rir-se, mas estava tão mimosa a pequena Celly!

- Vou levar umas nozes. Nunca se sabe quando sentirei fome pelo caminho!

Retornou e enfiou a mão num cesto, onde havia nozes em fartura. Levou algumas à boca e outras guardou num discreto saquinho que levou na bolsa.

- Já estou pronta! - disse, com o sorriso mais irônico do mundo, a boca de batom carmim a escancarar duas enormes fileira de dentes perolados, como se não tivesse levado nada para se aprontar!

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Sancha


Sancha já a esperava há um bom tempo. Também ia com dois toletes de braço de fora. Questionada, simplesmente respondeu, sem o menor pudor:

- Fico com tanto calor quando vejo o Eduardo, o mensageiro do John Rafael! Sabes, agora somos noivos e logo nos casamos! Ao menos eu tenho cá este xale e me cubro se a neve estiver muito brava!

E depois emendou:

- Depois do passeio, podem me deixar em casa mesmo...meu pai já deve estar bravo!




Yochanan


Yochanan aguardou pacientemente enquanto sua filha e a amiga dela Sancha, se aprumavam para a visita à cidade. Aproveitando o não curto tempo demorado para discutir alguns poucos assuntos do dia-a-dia da propriedade e da Ordem com Dimas e Eleazar.

Quando Celly finalmente se declarou pronta, com um sorriso estampado no rosto, todos os problemas pareceram desaparecer.

- Sois igual a tua mãe pequena, tens o mesmo sorriso que ela. - disse Yochanan chegando junto à filha e passando a mão pelos cabelos arrumando uma madeixa de cabelo escuro como a obsidiana.

Acompanhou-as então até o pequeno coche de negra caixa. Cinco cavaleiros já estavam em suas montarias cobertos por suas negras capas, um deles segurava um belo puro-sangue lusitano, de pelagem escura como as profundezas das sombras em uma noite sem lua.

Yochanan deixou que as meninas chegassem perto do animal de inteligente olhar. Aquele cavalo destacava-se dos demais, que em sua maioria tinham uma pelagem que variava entre a castanha e a baia, incluidos o par que puxavam ao coche eram de um castanho avermelhado parecido ao mogno.

- Este é Itzal, meu cavalo. - disse o Viana apresentando seu cavalo à filha. E então mostrando-lhe um que era passeado por um dos irmãos que cuidava do estabulo, disse: - E aquela ali é Garbi, e és tua quando regressarmos.

A égua, tinha a cor das areias de uma praia no verão, um creme claro levemente adouradado, com as crinas e cauda brancas. Uma pura-raça espanhola escolhida a dedo pelo Viana para sua filha.

Assim partiram pelos portões do Paço dos Arcanjos, dois cavaleiros lideravam o grupo seguidos pelo coche, ladeado por Yochanan, quem cavalgava ao lado da filha e Gascón ao outro lado, fechava a partida outros dois cavaleiros. Dois mais viajavam no assento do cocheiro, todos cobertos por seus negros mantos de inverno.


Alguns dias depois...


Os dias se sucediam em plácida monotonia, desde o regresso do Porto, sem grandes afazeres naqueles tempos de neve e frio, no Paço dos Arcanjos. Chegava-se a meados de fevereiro e com isso ao último mês de inverno.

O dia começava naquela manhã invernal com os resquícios da nevada da noite anterior ainda a cair suavemente sobre o manto álbido que cobria as terras do norte português.

Já se faziam vários dias desde a última vez que o Viana foi à cidade do Porto acompanhado de sua filha. A menina estava crescendo, e isso era algo que Yochanan teria que aceitar. Algum dia a sua pequena estaria namorando, noivando e então casando e indo morar com o seu senhor esposo. Aquela era a sina que todo pai de uma filha tinha que aceitar.

Perdido em seus pensamentos observava as ruínas, as paredes caídas e as colunas deitadas e cobertas de neve, mas ele via o paço em toda sua glória de antigamente. Uma poderosa propriedade rural, de uma nobre família romana de sobrenome Maximinus que deixara aquelas terras muitos séculos antes. De sua existência infelizmente os anais da historia pouco ou nada registram e apenas um rondel com o sobrenome familiar permanece como testemunha da sua existência.

A história mantida fora dos anais é um espaço sombrio e cheio de mistérios. Um deles sendo como chegou aquela grande propriedade às mãos do Viana e da Ordem da qual agora era Prior.

Mas isso não era importante neste momento no qual o Prior percorria as linhas daquela imponente villa, imaginando-a ali onde faltava. Em uma pequena mesa a um canto, repousavam três cartas prontas para serem despachadas. Seus destinatarios eram alguns dos más hábeis construtores do mundo.
Yochanan


Saindo da janela o Viana terminou de redigir a última das cartas e a estava selando quando tocaram à porta daquele que tinha se tornado seu despacho provisório, a pequena saleta nos depósitos onde se guardavam os mantimentos.

Voltando o olhar para a porta disse: - Ahh, Eleazar, entre entre.

-Prior, um mensageiro da cidade lhe trouxe essa missiva.

-Obrigado Eleazar. - disse o Prior recebendo a mensagem com o selo de sua irmã Vivian. Eleazar se dispunha já a sair quando Yochanan lhe deteve. - Um momento Eleazar. Despache estas mensagens ainda hoje. Os seus destinos estão ai escritos. Que sejam entregues em mãos. entendido? - Instruiu-o entregando-lhe as três cartas.

-Assim se fará reverendo Prior. - Diz Eleazar fazendo uma vénia e se retirando.

Após a saída de Eleazar, Yochanan quebra o selo que lacrava a mensagem, e a lê. Escrita com a caligrafia bem desenhada de sua irmã Vivian, ela pedia ajuda e ele que a encontrara na Casa do Povo do Porto.

Reunindo a dois de seus homens partiu sem demora para o sul, deixando como outras vezes, o Paço aos cuidados de Dimas.
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