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A Herdeira

--Julia_campos
Os olhos de Júlia faiscaram com aquela perspectiva. O tom sério do homem e a preocupação que lhe expressava fizeram-na pensar por instantes nas consequências de tal associação e daí vieram as dúvidas provocadas pela tenra idade e pelo receio de sair da sua área de conforto. O apelo ao salvamento do reino provoca-lhe um certo desconforto, afinal não era mais do que uma cachopa. Como iria ela auxiliar em feitos tão nobres e grandiosos? O que sabia ela daquelas coisas?

Os minutos passavam e o silêncio mantinha-se... As mãos da rapariga estavam já enroladas de novo no vestido e o olhar expectante do homem não auxiliava em nada a tomada de decisão. Não sabia ainda ao certo o que lhe seria pedido, mas o vigor profético daquelas palavras transmitia-lhe um certo sentido de responsabilidade e apelava à sua ambição. A pequena Júlia via ali a oportunidade de uma vida, a oportunidade de ganhar protagonismo. Tinha receios, tinha questões a colocar, tinha vontade de fugir, mas sabia que a ocasião podia ser única. Esses receios e dúvidas foram dissipados pelo desejo veemente de alcançar poder.


- Falai-me, senhor. Quero ajudar-vos nessa vossa missão... - falou por fim.
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--Dimas


Alabada seja a Luz dos Nove - pensou Dimas ao ouvir a aceitação da pequena, enquanto no exterior apenas sorriu um meio sorriso, de agrado e mistérios ocultos. Como se estivesse por compartir um grande segredo.

Ficou em silêncio alguns poucos minutos escrutando os sons daquela casa, tentando detectar alguma perfidiosa presença. De olhos fechados agora, tentava perceber cada som, quando esteve satisfeito abriu-os e olhou para a pequena com olhos ternos e firmes.

- Não sabeis o quanto me alegra que desejais ajudar-nos em nossa missão, pequena. E vosso papel será de grande importância, ainda que por vezes não o pareça. E é aqui nesta casa onde começa o vosso labor. Que sabes vos pequena, do homem a quem a Senhora desta casa vos prometeu? - inquiriu ele procurando saber que tanto teria e até mesmo poderia contar para Júlia sobre aquele que seria o objetivo de sua labor.
--Julia_campos
Júlia observou atentamente todas as movimentações e expressões daquele homem. Todos os seus desígnios e actos pareciam-lhe carregados de mistério e cautela. Aquele misticismo apenas redobrou a sua curiosidade e vontade de o ajudar.

- Não sei muita coisa, senhor... - Júlia encolheu os ombros e fitou as mãos por alguns momentos, parecendo receosa de falar. - A Madame pediu-me para não falar destas coisas, o senhor teria de guardar segredo...

Lançou um olhar assustado ao homem.
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--Dimas


Os prometo que guardarei o segredo pequena. - Disse o falso mercador. - Podeis contar-me o que sabes. E então talvez eu tenha algo mais que contar-te. -completou.
--Julia_campos
Aliciada pela perspectiva de conhecer mais sobre os segredos daquele homem Júlia disse:

- Ah senhor, não sei muita coisa não. A Madame disse-me apenas que era um homem jovem de cabelos negros, viciado em póquer e mulheres... - a voz da rapariga pareceu perder-se naquela última palavra, mas de imediato se recompôs - A Madame ensinou-me até algumas coisas sobre o póquer e... - o olhar de Júlia fixou-se na colcha emaranhada - Jogos de cama, senhor.
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--Dimas


Dimas sorriu, sorriu pela luz de inocência que ainda habitava o coração da menina Júlia. Mas o sorriso morreu rápido na face do falso mercador, pois muitas sombras se assomavam no futuro daquela menina. Ele ficou em silêncio, e nenhum ruído estranho se fez ouvir ao outro lado da porta. Satisfeito, ele se sentou na cama e disse:

- Pequena. Duras provações enfrentarás ao longo de vossa vida, e infelizmente essa primeira não lhe será menos difícil, e possivelmente será uma das mais terríveis que terás que viver. - e sem olhar para Júlia ele continuou. - Esse homem que virá aqui é de uma família inglesa muito poderosa, mas igualmente terrível. E nesse momento de fraqueza de nosso país, eles cá virão para aumentar os seus domínios. - Ele falava como se vislumbrasse uma tempestade que se aproximava. - Tempos terríveis se aproximam pequena, e precisamos que você fique muito próxima desse homem. Precisamos conhecer os planos deles, é a nossa única oportunidade. - Concluiu ele fechando os olhos.
--Julia_campos
Júlia ouviu cada uma daquelas palavras com especial emoção. O seu jovem coração batia ritmicamente contra o peito e o seu pensamento fervilhava. Na cabeça da pequena passaram os cenários mais díspares e as ideias mais maravilhosas, sentiu-se frágil e guerreira, teve tremores e vislumbres de sorrisos, os olhos brilharam de receio e desejo e no seu estômago milhões de borboletas esvoaçaram. Sonhara com uma oportunidade assim toda a vida e agora só tinha de agarrá-la e segurá-la bem firme.

- Como posso auxiliar, senhor? Diga-me o que fazer. - pediu solicitamente - Quero ajudar-vos a salvar o reino da malvadez dos estrangeiros.
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--Dimas


Dimas não sorriu, nem sequer olhou para a pequena, apenas se levantou e caminhou até a porta novamente e suspirou como se estivesse cansado. Cansado de um jogo de sombras, de uma guerra de atrito, de uma prova de resistência.

Ele suspirou novamente, e olhou para cima, o céu clareava naquela manha no Porto enquanto o velho mestre rememorava o passado, apoiado em seu bastão à espera deles, e a idade ficou-lhe pesada.

Seu destino não era mais só seu há muitos anos, sua vida estava dedicada à Ordem e à Causa, esse era o Caminho que lhe cabia aos que se uniam à Ordem. E assim devia ser, pois os sacrifícios que eles faziam nas sombras, permitia que a Luz brilhasse para os demais. Talvez algum dia isso mudaria. Talvez não. O que sim era certo é que a labor da Ordem jamais cessaria.

O velho mestre então buscou no bolso de suas vestes, e ali o encontrou. Um pendente, gêmeo idêntico, daquele que ele lhe havia entregue tantos anos antes, quando ela era apenas uma menina, e ele lhe havia encomendado que fosse uma espiã, que fosse íntima dele, daquele homem terrível, e que descobrisse todos os segredos dele.

Era um pendente especial, pois, quando unidos formavam a Cruz de Azure, mas separados, era apenas uma meia moeda de estilizadas linhas de bronze e prata, ao estilo dos árabes que controlavam o sul à tanto tempo. Uma peça engenhosa decerto.

Quanto eles a tinham feito sofrer nas mãos de seus inimigos? Quantos males haviam envenenado aquela inocente alma a pedido de um bem maior? Quantos haviam dado suas vidas para manter o Equilíbrio? Quão perto eles estiveram de desaparecer no final... Que terrível preço a vitória lhes havia tomado. E tal como esses pensamentos chegaram ele os descartou, pois as coisas se deram como deveriam dar-se, e não poderia ser de nenhuma outra maneira.
Maria_madalena
Madalena saíra da Babilónia com um mau pressentimento. Durante os seus vinte e dois anos de vida, nunca vira Júlia abatida daquela forma, com as lágrimas nos cantos dos olhos e o desespero patente. Era bem verdade que o seu aspecto físico já não era o mesmo, que os traços de beleza se haviam esbatido e que o corpo já não provocava os homens, mas a sua personalidade, a atitude altiva, o jeito maquiavélico e a língua mordaz continuavam presentes. Perdida em tais divagações, a meretriz caminhou rua abaixo de olhos postos no chão, alheia aos transeuntes, bêbedos e mendigos. As vozes que se erguiam, sinónimas do despertar da cidade, não chegavam aos seus ouvidos e os seus olhos preocupavam-se apenas com os dejectos e outras imundices que cobriam a rua. Foi somente quando o estômago rugiu em desagrado e a meretriz pensou em comprar um pão, que se apercebeu da ausência do seu alforge. As mãos apalparam repetidamente e de diversas formas o corpo e o padeiro olhou-a desagradado.

Desculpe, senhor, devo ter-me esquecido dele em casa... - disse Madalena já com um pé no caminho, antes que o homem se lembrasse de organizar um motim.

A meretriz voltou a efectuar o mesmo percurso, desta vez dirigindo-se para a Babilónia. O passo era agora mais rápido, assim como o tempo que demorou a alcançar o seu destino foi mais curto. Silenciosa como a haviam ensinado a ser, Madalena adentrou no bordel.

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--Dimas


O velho esperava e observava aquela porta... quando uma moça se aproximou com apremio e entrou com grande cuidado. Uma das moças que ali trabalhavam e que haveria se esquecido de algo decerto... Mas havia algo mais naquela jovem, algo que latejava na memoria do velho Dimas. O parecido era impressionante.

- Será possível? - pensou em voz alta, mas que era apenas um sussurro.
Maria_madalena
A sala de estar da Babilónia estava escura e de atmosfera pesada. Copos sujos e peças de roupa estavam espalhadas por todo o cómodo e a meretriz soltou um pequeno sorriso, divertida com aquela confusão outrora tão prazerosa e lucrativa. A luz no exterior ainda não era suficiente para alumiar a divisão e a claridade provinha apenas de uma tosca vela posicionada num dos castiçais centrais. Madalena não dera mais do que dois passos quando se apercebeu de um vulto numa das poltronas, de imediato a sua mão procurou o punhal que levava seguro na meia, junto à coxa direita. Não chegou a desembainha-lo. Os cabelos negros manchados de branco e os trajes igualmente negros, levaram-na a reconhecer Júlia. A proxeneta ainda não abandonara a poltrona. Pé ante pé a meretriz aproximou-se, tomando cuidado para não perturbar o silêncio tétrico.

Júlia estava de olhos fechados, segurando um pendente entre as mãos e com o rosto molhado pelas lágrimas. Madalena abriu a boca em espanto e levou as mãos ao peito, tentando segurar-se para não a interpelar de forma desordeira. Apesar da visão da sua fraqueza, a meretriz sabia que Júlia não era uma mulher doce. A meretriz pensou em sair, evitar conflitos e trocas de palavras, mas estava demasiado petrificada por ter encontrado a proxeneta assim, espantada por esta ainda não se ter apercebido da sua presença, astuta como era.

O pendente chamara-lhe a atenção e Madalena olhava-o intrigada.

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--Julia_campos
Perdida nas memórias do passado, Júlia nem se apercebeu da chegada de um intruso. A proxeneta permanecia de olhos fechados e pendente apertado na mão. A proximidade daquele pedaço de metal tinha efeitos devastadores em si, tal era o tumulto de sensações. Foi somente quando sentiu o ar deslocar-se à sua frente que se apercebeu dos olhos curiosos postos em si. Os seus continuavam fechados, mas eram impossível não pressentir aquele tipo de escrutínio. Deixou-se ficar assim durante mais uns momentos, procurando coragem e força para enfrentar o visitante. Bem no seu interior, Júlia sabia que à sua frente estava um espelho, as semelhanças eram inegáveis.

Por fim, abriu os olhos.

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Maria_madalena
Sobressaltada, Madalena deu um passo para trás. O seu coração precipitou-se num bater desenfreado e a boca da meretriz abriu-se para falar.

Dona Júlia, desculpe, desculpe, não foi minha intenção incomodar, irei já embora.

Dito isto Madalena voltou-se para sair. Não se preocupou mais com o seu alforge ou com a fome que lhe rugia no estômago. O receio de exaltar a proxeneta era bastante superior.
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--Julia_campos
A voz aguda de Júlia fez-se ouvir:

- Madalena, espera, não vás.

Os olhos marejados de lágrimas da proxeneta olhavam hesitantemente para a jovem meretriz que estava agora mais perto da porta do que de si.
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Maria_madalena
O coração de Madalena falhou um batimento e, por instantes, manteve-se virada para a porta de olhos fixos no puxador tão perto de si, mas ao mesmo tempo tão longe. Não lhe agradava aquela situação. Júlia não era uma mulher vulnerável e a meretriz não queria ser a vítima daquele acesso de tristeza da proxeneta. Pensou em desculpar-se, alegar uma indisposição, mas nenhuma palavra serviria para enganar os olhos negros e astutos que a fitavam. Não lhe restava outra opção senão voltar-se. E assim o fez, aguardando silenciosamente por algum sinal ou palavra.
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